Com cadeias lotadas e pandemia, magistrados reveem reincidência para crimes insignificantes

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Em São Paulo, um jovem foi condenado a quatro meses de prisão por furtar chocolates de uma loja de conveniências. No Paraná, outro homem tentou levar três camisetas de R$ 12 sem pagar, foi detido e recebeu sentença de um ano de cadeia. No Rio, um idoso em condição de rua, com fome, roubou comida de uma loja e parou atrás das grades em meio à pandemia de Covid-19.

O cenário se repete no Judiciário brasileiro, apesar de esses delitos poderem ser enquadrados no chamado princípio da insignificância, que busca não punir condutas com resultados irrelevantes dos pontos de vista jurídico e patrimonial.

Com cadeias lotadas, a tendência começa a mudar. O STJ (Superior Tribunal de Justiça) manteve decisão do ministro Felix Fischer que absolveu um homem condenado por furtar três xampus, mesmo com o sujeito sendo reincidente no crime de roubo.

A sentença do STJ, segundo juristas, vai na contramão do que costumam decidir os tribunais em condenações do tipo, como citou o magistrado em sua decisão monocrática.

Motivos

Fischer lista quatro requisitos para reconhecer a insignificância: minima ofensividade da conduta do agente, nenhuma periculosidade social da ação, reduzidíssimo grau de reprovabilidade do comportamento e inexpressividade da lesão jurídica provocada.

Sua decisão abre margem para que outros crimes menores com réus não primários possam escapar da condenação, em um momento que os tribunais de instâncias superiores contam com 1.501 manifestações enviadas apenas até setembro de 2020 sobre o tema da insignificância.

Apesar de não existir levantamento consolidado dos últimos anos, é possível afirmar que, na década, explodiu o número de pedidos de insignificância nos tribunais superiores. A maioria dos magistrados entende que os réus reincidentes não têm direito ao reconhecimento do princípio. Por outro lado, quase todos os casos são relativos a pessoas em situação de vulnerabilidade extrema, principalmente quando envolvem furto de produtos de higiene e comida.

"É muito comum o que os juristas chamam de furto para se alimentar. Normalmente, esses delitos estão ligados à vulnerabilidade social e só aumentam, pois não se desenvolve nenhuma política pública para essas pessoas", aponta o coordenador de defesa criminal da Defensoria Pública do Rio de Janeiro, Emanuel Queiroz.

"Não se aplaude a conduta de quem pega qualquer coisa, mas qual o valor social disso? A que se presta a aplicação da lei penal? Será que vai ter algum resultado? Ou só o aprofundamento da desigualdade e destruição de um cidadão?", indaga.

Entre alguns casos do tipo que chegaram ao STJ e ao STF, estão o de um rapaz sentenciado a um ano de cadeia pelo roubo de um botijão de gás do irmão, e um réu que pegou pena de quatro meses por furtar 5,8 kg de carne.

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