Vamos começar com uma verdade bem simples: a Conmebol tem entre pouca e nenhuma moral com os torcedores e clubes brasileiros.
Dá para gastar vários parágrafos só citando as diversas vezes em que o órgão máximo do futebol sul-americano agiu de maneira polêmica ou controversa, pra colocar em termos bem leves e gentis.Antes de partir para a patifaria que foi a edição de 2018 da Libertadores, dá para falar das mudanças nas regras que vão impedir as festas nos estádios, uma das coisas legais que restavam na competição.
E isso já aconteceu no ano passado, quando a torcida do Fluminense foi impedida de fazer sua festa, com o tradicional pó de arroz e fumaça nas cores do clube. O Flu acabou caindo nas semifinais da Copa Sul-Americana.
A bronca do ano, porém, é dos hermanos argentinos, que viram o que seria o momento de maior glória e prestígio do seu futebol desde a final da Copa de 2014 se transformar num show de horrores, que pode culminar num fiasco sem precedentes e já rebaixou ainda mais a forma como o futebol sul-americano é visto.
Se formos ficar apenas em 2018, já dá pra fazer uma lista de momentos de raiva, vergonha ou mesmo ambos juntos proporcionados pela Conmebol, órgão máximo do futebol sul-americano.
O primeiro que vem à mente é a prisão do então presidente da instituição, Juan Angel Napout, que foi fazer companhia ao famigerado ex-presidente da CBF José Maria Marin no xadrez, condenados no mesmo processo nos EUA.
Isso serviu não apenas para expor ao mundo mais um capítulo da sujeira da cartolagem sul-americana, como ainda por cima deu uma ajudinha na desmoralização do futebol de toda a América do Sul, que viu suas lideranças julgadas por forças estrangeiras e de um país como os Estados Unidos, que é símbolo cultural de oposição ao esporte bretão e cujo povo não esconde seu desdém pelo esporte mais popular do planeta.
Mas tudo bem, mesmo com o vexame fornecido de cortesia pela Conmebol, não dá pra dizer que ela estava sozinha nessa. Aqui no Brasil a CBF e mundialmente a FIFA também viram seu lado negro exposto ao mundo em casos escandalosos de corrupção. Não é isso que torna a Confederação Sul-Americana de Futebol especial, e sim as decisões dela que afetaram as coisas dentro de campo.
Qualquer torcedor brasileiro tem motivos de sobra para sentir raiva da Conmebol e duvidar da boa-fé da instituição, para deixar numa linguagem bonita e não tão agressiva quanto poderia ser.
A escalação do zagueiro Luiz Otávio da Chapecoense, ainda na fase de grupos da Libertadores, resultou na reversão do placar de vitória conta o Lanús, tirou os pontos dos catarinenses e causou sua eliminação precoce na competição.
Depois disso, outra escalação irregular, dessa vez do jogador Carlos Sanchez, do Santos, custou ao Peixe uma derrota por 3x0 perante o Independiente imposta pela Conmebol, numa decisão que deixou indignado até mesmo os não-santistas, e que não foi a primeira e nem a última do tipo em casos recentes.
Ainda nesta mesma edição da Libertadores, houve o caso envolvendo Dedé do Cruzeiro e sua expulsão bem mandraque contra o mesmo Boca Juniors que chegou à final. O mau-caratismo do árbitro no lance da expulsão foi tão claro que a Conmebol não teve escolha a não ser anular o cartão vermelho e permitir ao zagueiro jogar o jogo de volta – e ser expulso de novo.
O problema, no final das contas, nem foi isso, mas a falta de proporção nas decisões da confederação e, principalmente, a falta de equilíbrio quando comparadas com casos semelhantes com outros times – especialmente os argentinos. Falando no português claro, River Plate e Boca Juniors já escalaram jogadores irregulares e não foram punidos e regularmente são ajudados pela arbitragem de maneira escancarada.
A Conmebol arruma desculpas que beiram a ficção científica, como a história de que o aviso da suspensão do jogador da Chapecoense foi enviado por e-mail três dias antes– sério mesmo? É como se o órgão fosse regido por eternos estagiários que têm medo de pegar um telefone mas têm imunidade para agirem como quiserem contra os times brasileiros.
Treinador do River, Marcelo Gallardo
E então chegamos à final da Libertadores. A hora da redenção. Dois brasileiros em grande fase eliminados por dois argentinos com times, na melhor das hipóteses, arrumadinhos. Teve jornal argentino e brasileiro alardeando o “peso da camisa” de River e Boca, e talvez seja realmente por aí. Mas não há camisa pesada que esconda a sujeira por trás da cartolagem e da arbitragem da Conmebol.
Ainda na semifinal, mesmo com revisão do VAR, num lance pra lá de polêmico, foi validado um gol com a mão do River, o de empate no estádio do Grêmio. Aliás, até agora os times brasileiros não têm nada a agradecer ao polêmico árbitro de vídeo, que mais trouxe confusão e novos problemas do que ajudou a resolvê-los.
Aliás, coincidentemente (ou não) Andrés Cunha seria o árbitro escolhido pela Conmebol para apitar a grande final entre os argentinos. Ah, a final...
Ninguém ficou minimamente surpreso com as notícias de confusão no jogo de ida na Bombonera, mas o jogo foi bom e terminou em um 2x2 bem vantajoso para o River Plate, que só precisaria empatar sem gols ou em 1x1 em casa para levantar a taça. A história que se viu sobre o que deveria ser o segundo jogo, como todo mundo sabe, foi bem diferente.
Ônibus apedrejado, jogadores do Boca machucados, diretoria louca de raiva e mais uma cena de puro vexame do futebol sul-americano perante o mundo. O resultado foi tão incrivelmente vergonhoso que a FIFA já deixou claro que a chance de a candidatura da Argentina (junto com Uruguai e Paraguai) sediar a Copa de 2030 agora é praticamente nula.
A pergunta mais importante a fazer é: até que ponto é justo punir o clube e toda sua torcida pela ação de umas poucas dezenas de imbecis que acharam que seria uma ótima ideia receber o rival a pedradas no dia do jogo, com a casa já cheia e uma festa linda nas arquibancadas?
Colocando dessa maneira, parece que o River estaria sendo injustiçado. Mas quando o Boca Juniors entrou com o pedido na Conmebol para tentar levar a Libertadores no famoso tapetão, muita gente se dividiu: seria justo dar o troféu na mão do time que foi beneficiado duas vezes na mesma competição? A verdade é que a humilhação e o desrespeito que a Conmebol inspira chegaram em níveis insustentáveis e inéditos.
Novamente aqui, o problema é o parâmetro. Tomemos como exemplo a UEFA, que embora longe de ser santa, sempre foi bastante rígida quando o quesito é punição. Clubes ingleses foram banidos das competições europeias por anos e anos graças a ação de seus hooligans, numa ação que mudou para sempre a cara do futebol inglês e europeu, e para melhor, sem dúvidas.
Convenhamos que se apedrejar a delegação adversária na entrada do seu estádio não for um ato de hooliganismo, não se sabe o que mais pode ser.
A Conmebol preferiu punir o River com multas bem pesadas, perda de mando de campo e algo inédito numa final de Libertadores: que o jogo decisivo seja disputado fora do país. A reação do torcedor, claro, foi de desprezo e incredulidade. Do treinador Marcelo Gallardo, idem.
A justificativa oficial da confederação é a cereja no bolo: os cartolas afirmam que Madrid é a cidade com mais conexão cultural com a Argentina e a que mais recebe turistas argentinos e que, por isso, é a sede ideal.
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